Eu gosto de céu azul,mar.Gosto de conversar fiado com os amigos,gosto de rir.

01 Februar 2006

Saudações da terra do nada




14 de fevereiro de 2001
Prezada Solange.
Espero que em sua cidade o inverno esteja menos inversoso, o sol mais solarengo, a felicidade mais feliz e que os pássaros já estejam cantando nas árvores e dentro dos despertadores. Espero também que tenha recebido as duas cartas que viajaram, no mes passado, dentro de um único envelope.
Aqui, onde nenhuma rua tem sabor, o céu continua azul e a noite aposta, em vão, suas belíssimas estrelas com os tolos parceiros de cidade. Só à tarde, há um ligeiro alvoroço : academias, igrejas, assembléias e aparelhos sonoros saem à caça da população. É o extase caxambuense. Depois, a depressao: Trançador, Rua da Palha, cemitério, Bosque, Isolamento, Alguém come-couve, Tião Louco, a Linha do Bonde, a Favela, o crime de Suzana, o sorriso dos Gadbens, matadouro municipal, o córrego Bengo, o tremendal, o morro, o asilo Sto. Antônio, as freiras de chapéu-grande, a moça esfaqueada, Sílvio Canjica, o casarão abandonado dos Guedes, o lago assoreado, a Rua dos Porcos, Alto dos Cabritos, o supermercado (onde vagam os catecúmenos da cidade), o bairro do Sare e da Mombaça, o reformatório chamado Patronato, enfim, uma perfusão de lúgubres paragens e personagens condenados ao vazio.
(Da colecao cartas dos amigos
Eustáquio Gorgonne, www.tanto.com.br )

Foto: Caxambu, início do século XX